Vilão do urbanismo de Nova York, Robert Moses vira herói em HQ
Uma das figuras mais controversas da história do urbanismo, o norte-americano Robert Moses acaba de virar herói numa graphic novel escrita pelo francês Pierre Christin. Nos anos 1960, quando tentou passar uma via elevada por cima de Greenwich Village, um dos bairros mais charmosos do sul de Manhattan, Moses acabou travando uma briga feia com a urbanista Jane Jacobs, que defendeu a escala do bairro e a dinâmica de suas ruas no clássico ensaio “Morte e Vida de Grandes Cidades”.
No quadriculado da grelha de ruas que define o urbanismo nova-iorquino, o Village é algo à parte. Loteado antes da expansão rumo ao norte da ilha, ainda mantém praças e jardins surgidas pelos cruzamentos das ruas em ângulos oblíquos. Jacobs faz uma defesa apaixonada dessa dinâmica em contraponto aos megaloteamentos que só acentuaram a pobreza e os índices de criminalidade em outras partes de sua cidade.
Moses tinha outra visão para Nova York, enxergando a ilha de Manhattan e distritos como o Queens e o Bronx como pontos da geografia que tinham de ser interligados por vias expressas, grande parte delas elevadas, sempre privilegiando o uso do automóvel em detrimento do transporte público.
É claro que essa oposição entre Moses e Jacobs extrapola o caso nova-iorquino. Dos anos 1970 em diante, metrópoles do mundo todo se viram diante da decisão entre preservar malhas urbanas inteiriças, que funcionavam em pequena escala, e passar o rolo compressor por cima de tudo para agilizar o tráfego viário –São Paulo e a catástrofe chamada Minhocão, da mesma época de Moses e seus megaempreendimentos, está aí para provar.
Na HQ de Christin, um parisiense talvez enamorado demais pelos grandes bulevares projetados pelo barão de Haussmann na capital francesa, enaltece o legado de Moses. Seria, de fato, reducionista fazer a caveira do urbanista, mas o lançamento dos quadrinhos de Christin agora em tradução para o inglês só mostra que essa discussão está longe de ser sepultada.