Na crise, o governo se faz de morto
Marcelo Araújo, secretário paulista da Cultura, é apaixonado pela arte e grande conhecedor do assunto. No governo, é talvez um raro exemplo de profissional apontado para cuidar de algo pelo qual tem interesse e domínio técnico acima de qualquer suspeita. À frente da Pinacoteca do Estado, foi um dos principais responsáveis por transformar o museu da Luz numa referência do cenário artístico nacional e da América Latina, iniciando parcerias com a Tate Modern, de Londres, e consolidando as benesses de um modelo de gestão depois copiado pelo Brasil afora.
Mas ele tem se calado. Vejo o secretário em quase toda abertura de exposição na cidade. Está sempre rodeado de artistas, curadores e críticos e tem conversas animadas com todos ao redor. Não foge. Mas quando o assunto é a crise que assola as instituições culturais do Estado, estando os museus ligados à sua pasta entre as maiores vítimas, seu silêncio me incomoda. Há pouco, publicamos na “Ilustrada” uma reportagem sobre os efeitos dos cortes no orçamento da Cultura sobre os museus no país. No caso dos museus paulistas, há uma onda de demissões na Pinacoteca, no MIS, no Paço das Artes e no Afro Brasil. Sem contar a redução de horários e alterações na programação em outros deles, como o Museu da Casa Brasileira e o Museu de Arte Sacra.
Enquanto preparávamos a reportagem, tentamos contato com todas as esferas de governo. Eu já vinha tentando falar com o secretário há muito tempo, mas sua assessoria de imprensa dizia não haver disponibilidade. Araújo também não esteve disponível ao longo de semanas para comentar o fato de que todo o projeto do Complexo Cultural da Luz, pomposo desenho dos arquitetos suíços Jacques Herzog e Pierre De Meuron que seria um dos maiores legados dos últimos governos tucanos para o Estado, está paralisado. Não há nem prazo para que a coisa comece a sair do papel.
Ninguém está sob a impressão de que as coisas estão fáceis. Com a economia em situação cada vez mais precária, não é improvável que projetos sejam revistos, adiados ou cancelados. Mas espanta que a política deste governo seja a do silêncio total, como se nada estivesse acontecendo. Seria interessante ter uma dimensão real de quanto as coisas na Cultura paulista vão ser afetadas por uma crise que já se tornou inegável. Caso contrário, vamos continuar acompanhando essa história sempre pela tangente. Numa semana em que São Paulo celebra as cifras estratosféricas do mercado da arte, com a abertura da feira SP-Arte, por que não falar também de política?