Não é remix, a moda agora é ‘rework’
Na pegada do remix da semana passada, quando escrevi aqui sobre a polêmica causada pelo artista americano Richard Prince e sua apropriação de imagens do Instagram, me lembrei de outro caso interessante de novas versões de uma obra. Aclamado pela crítica musical como o “rei do rework”, o DJ francês Tristan Casara, mais conhecido como The Avener, se tornou um queridinho da cena musical europeia nos últimos meses com suas versões electro de músicas que passaram “despercebidas”, entre elas seu grande hit até o momento, “Fade Out Lines”, da banda australiana Phoebe Killdeer.
Mas The Avener nega que faça um remix. Ele faz um “rework” das canções. Não passa de acrescentar uma batida electro às músicas, aliado a uma espécie de bate-estaca sutil de fundo, acelerar o tempo da canção, ou, nas palavras da crítica Johanna Luyssen, do jornal “Libération”, fazer uma versão “vodca com Red Bull” daquilo que já existia. Nisso, o termo “rework” pega bem, ao contrário de um reles remix. Não sou especialista em música, mas dando uma pesquisada vi que entre os entendidos o remix é “despedaçar uma faixa e acrescentar seu toque próprio a ela” e que o “rework” é uma versão light do remix, com uma mudança na batida, com mais graves, e um ritmo mais veloz.
Jargão à parte, acho as duas versões deliciosas. Mas é nítido que nesse lance de remix e “rework” há sutilezas também de escopo legal. Talvez seja mais legítimo um artista dar roupagem no calibre “rework” a alguma coisa do que um simples remix. Num tribunal, ter retrabalhado toda a música para adaptar algo com pegada de música de elevador a uma pista de dança talvez desperte mais a simpatia de um juiz a favor de quem retrabalhou a tal canção.
Em seu disco de estreia, aliás, The Avener também pegou carona no sucesso midiático do recém-redescoberto Rodriguez, o cantor folk americano que virou celebridade na África do Sul em tempos de apartheid, foi dado como morto e ressurgiu há três anos quando um documentário sul-africano, “Searching for Sugar Man”, venceu o festival Sundance e o Oscar da categoria. O filme de Malik Bendjelloul provou que, ao contrário do que se pensava até então, o autor de “Cold Fact”, canção que tinha se tornado um hino contra o regime de segregação racial no país africano, estava vivo e trabalhando como um pedreiro anônimo numa cidade do centro-oeste dos Estados Unidos.
Da mesma forma que um documentário deu vida nova a Rodriguez, The Avener, que adaptou sua “Hate Street Dialogue” com direito a um clipe em animação 3-D, ressuscitou uma série de faixas. O que parecia insípido à primeira orelhada parece ter ganhado outro gosto na paleta eletrônica do francês. E, por enquanto, ninguém acusou The Avener de plágio ou apropriação indevida. Se a moda pega, quem sabe Richard Prince, Luc Tuymans e a Dolce & Gabbana acabem entrando na onda do “rework”.