Atos falhos (tétricos) em Veneza
Uma das mostras mais fortes do ano, “Slip of the Tongue” é uma coletiva organizada pelo artista vietnamita Dahn Vo no Punta della Dogana, museu do bilionário francês François Pinault, em Veneza. Vo, tema de um perfil na “Ilustrada” deste domingo, fez uma seleção de obras próprias e de outros artistas que se enquadrassem no tema de traumas, guerras, violência e conflitos que deixam rastros indeléveis. Em paralelo à Bienal de Veneza do nigeriano Okwui Enwezor, que faz um retrato catastrófico do mundo atual, a exposição parece sublinhar o clima de fim de festa que varre o mundo. Veja a seguir algumas das obras mais impactantes da mostra na cidade italiana.
Dahn Vo. Deslocando o lustre do antigo salão de baile do hotel Majestic, em Paris, para a Punta della Dogana, em Veneza, o artista reflete sobre o legado da Guerra do Vietnã. Foi debaixo desse lustre que vietnamitas assinaram um primeiro —e inútil— cessar-fogo ao conflito em 1973, dando início a mais uma rodada de combates que só chegariam mesmo ao fim dois anos depois.
Michael Elmgreen e Ingar Dragset. Um trampolim impossível, que se projeta sobre o mar em Veneza, é a obra do dinamarquês Michael Elmgreen e do norueguês Ingar Dragset. É algo que fica no limiar entre desejo e realidade, mas que também ecoa a desolação do conjunto das obras na mostra ao propor uma fuga desesperada para fora da vida, onde talvez tudo fique melhor.
Nairy Baghramian. Confrontando noções de artesanal e industrial, ou a fricção entre objetos de arte e design, a artista iraniana cria esse objeto híbrido, em que formas orgânicas invadem a placidez de uma vitrine típica de espaços expositivos, pondo em xeque a ideia de passividade de uma obra.
Peter Hujar. Os autorretratos e retratos do artista norte-americano que morreu de Aids em 1987 formam um dos conjuntos mais impactantes da mostra, um verdadeiro registro da vida que se esvai nos meses finais da existência de todos esses homens vitimados pela epidemia ainda jovens.
Bertrand Lavier. O artista francês abre a mostra com um trabalho em que junta fragmentos de várias esculturas para formar uma construção híbrida, forjada pela violência dos gestos, quase um corte e costura entre épocas e materiais distintos em alusão à brutalidade dos processos históricos.